A reunificação da esquerda política em Portugal tem ganho relevância nos últimos meses, especialmente após as eleições legislativas de maio de 2025, como estratégia para contrabalançar o avanço das forças de direita e extrema-direita — como a Aliança Democrática (AD), o Chega, a Alternativa Democrática Nacional (ADN) e o Ergue-te. O objetivo principal é fortalecer a oposição parlamentar e local, defender os valores democráticos da Constituição de 1976 e evitar cenários de polarização que possam levar a um retrocesso autoritário, semelhante ao que se teme com o crescimento de partidos nacionalistas e populistas.
Contexto Político Atual
- Eleições Legislativas de 2025: A AD (coligação PSD/CDS) venceu com cerca de 32% dos votos e 89 deputados, formando um governo minoritário em junho de 2025, liderado por Luís Montenegro. No entanto, o Chega obteve um resultado histórico, empatando com o PS em 58 deputados cada, consolidando-se como a terceira força e pressionando para maior influência na agenda da direita. O ADN, um partido de direita nacionalista fundado recentemente, e o Ergue-te (antigo PNR, ultranacionalista), embora com resultados marginais, representam o espectro mais radical, com discursos anti-imigração e eurocéticos que alimentam receios de erosão democrática.
- Desafios para a Esquerda: O PS sofreu uma derrota significativa, caindo para níveis históricos, enquanto o Bloco de Esquerda (BE), a Coligação Democrática Unitária (CDU, PCP/PEV) e o Livre perderam terreno — exceto o Livre, que subiu ligeiramente para 6 deputados. Essa fragmentação deixou a esquerda com apenas cerca de 20% dos assentos no total, tornando-a vulnerável a uma maioria de facto de direita no Parlamento.
O Papel da Reunificação
A ideia de "unidade da esquerda" não é nova em Portugal (recordemos a "geringonça" de 2015-2019), mas ganhou urgência pós-2025 como ferramenta para:
- Oposição Coordenada no Parlamento: Partidos como PS, BE, Livre e CDU têm admitido entendimentos pontuais para viabilizar moções de rejeição ou bloquear propostas da AD e do Chega, como reformas laborais ou políticas migratórias restritivas. O objetivo é impedir que o governo minoritário dependa tacitamente da extrema-direita, o que poderia normalizar discursos autoritários.
- Fronte Eleitoral nas Autárquicas de 2025: Com as eleições locais a decorrer em outubro, já há coligações concretas:
- Em Lisboa: PS + BE + Livre + PAN, com o objetivo de reconquistar a câmara e demonstrar viabilidade de uma frente ampla.
- Em Leiria: BE + Livre + PAN, onde líderes como José Peixoto enfatizam que "a unidade da esquerda é uma necessidade premente" para combater o avanço do Chega local.
- A CDU participa em debates conjuntos, mas mantém alguma independência, propondo alianças seletivas para evitar perdas de identidade. Essas coligações visam maximizar votos em círculos uninominais, onde o sistema favorece maiorias, e enviar um sinal de coesão contra a "direita fascistóide", como descreveu um líder do PCP.
- Perspetiva Presidencial e de Longo Prazo: Para as eleições presidenciais de 2026, o PCP lançou a candidatura de António Filipe, apostando explicitamente na "unidade da esquerda" para enfrentar o "avanço da extrema-direita" e defender a Constituição contra ameaças de "ditadura disfarçada". Isso inclui apelos ao PS para uma frente anti-Chega, ecoando debates internos no Livre e no BE sobre um "referendo interno" para candidaturas unificadas.
Propósito: Evitar uma "Ditadura"
O receio de uma deriva autoritária surge do crescimento do Chega (de 12 para 58 deputados), que usa retórica anti-sistema e anti-UE, semelhante a modelos húngaros ou polacos. A reunificação serve como barreira:
- Democrática: Fortalece a vigilância sobre violações constitucionais, como propostas do Chega para restringir direitos de minorias.
- Estratégica: Evita a dispersão de votos que beneficiou a direita em 2025, onde o Bloco perdeu 75% dos seus votos em "desperdício" devido ao sistema eleitoral.
- Social: Mobiliza bases progressistas contra polarização, promovendo agendas comuns em habitação, saúde e igualdade.
No entanto, persistem tensões: o PS é visto como "centrista demais" pelo BE e PCP, e o Livre prioriza ecologia sobre unidade absoluta. Apesar disso, analistas veem estas iniciativas como um "balanço necessário" para a democracia portuguesa, especialmente com o governo minoritário instável. Se bem-sucedidas nas autárquicas, podem pavimentar uma "geringonça 2.0" em legislativas futuras.

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