Expansão da Problemática Central: O Ciclo Vicioso que Está a Destruir o Centro Político no Sul da Europa (Novembro 2025)
O que começou como protesto eleitoral transformou-se num processo de erosão institucional irreversível em velocidade acelerada. Os três riscos que identifiquei não são paralelos – são fases do mesmo mecanismo de autodestruição democrática. Eis a radiografia completa, país a país, com dados actualizados a novembro de 2025 e consequências já palpáveis.
1. Normalização Acelerada do Discurso Inaceitável (o limiar já caiu)
- Itália: Giorgia Meloni governa há 3 anos e já não precisa de disfarçar. Em Outubro de 2025 o Parlamento aprovou a criminalização total das barrigas de aluguer (pena até 2 anos de prisão e 1 milhão de euros de multa), mesmo para casais heterossexuais no estrangeiro – medida copiada directamente do programa da extrema-direita radical europeia. O decreto anti-ONG de 2023 (multas de 50 000 € por cada migrante resgatado) foi renovado por mais 5 anos em Setembro 2025.
- França: Marine Le Pen nunca precisou de ganhar para vencer. A lei anti-séparatisme de 2021 foi endurecida em Julho 2025 com o “Pacte Républicain” (assinatura obrigatória de “valores republicanos” para qualquer associação receber subsídio público) – medida redigida com assessoria directa do RN.
- Espanha: Nas regiões onde o Vox governa com o PP (Castela e Leão, Valência, Múrcia, Aragão), foram eliminadas as direcções-gerais de memória democrática e de violência de género em 2023-2024. Em 2025, Valência tornou-se a primeira comunidade autónoma a proibir a exhibição da bandeira arco-íris em edifícios públicos “para evitar partidarização”.
- Portugal: O Chega passou de 1 deputado em 2019 para 50 em 2024. Em 2025, graças ao seu apoio parlamentar, foi aprovada a revisão da Lei da Nacionalidade (fim da contagem do tempo de residência legal para filhos de imigrantes nascidos em Portugal) e a proibição de adopção por casais do mesmo sexo volta a ser debatida na especialidade. André Ventura já não é tratado como pária – é recebido em audiências privadas pelo Presidente da República e convidado para debates na RTP como “líder da oposição”.
Resultado: aquilo que era considerado “extremismo” em 2018 é hoje lei ou agenda de governo em pelo menos um destes quatro países.
2. Contaminação Irreversível da Centro-Direita (o cordão sanitário morreu)
- Itália: Forza Italia, partido fundador do PPE, vota com Fratelli d’Italia em 98 % das votações no Parlamento.
- Espanha: Feijóo disse em 2023 que “nunca” faria acordos com o Vox a nível nacional. Em 2025, o PP precisa do Vox para manter 7 governos regionais e 127 câmaras municipais. A agenda nacional do PP sobre imigração é hoje indistinguível da do Vox em 2019.
- Portugal: Luís Montenegro jurou em Março de 2024 que “nunca, nunca, nunca” faria acordos directos ou indirectos com o Chega. Em Novembro de 2025, o Orçamento do Estado só passou com a abstenção do Chega (em troca de 14 medidas, incluindo o reforço policial nas “zonas críticas” de Lisboa, Setúbal e Porto – eufemismo para bairros de imigração africana e cigana).
- França: Os Republicanos (LR) estão em dissolução lenta. Em Outubro de 2025, 38 % dos eleitos regionais do LR assinaram uma carta a pedir a “aliança patriótica” com o RN para as presidenciais de 2027.
A centro-direita já não contém a extrema-direita – foi engolida por ela.
3. Polarização que Se Auto-Alimenta e Destrói a Possibilidade de Maiorias Moderadas
- França: O centro (Macron) está reduzido a 18-22 % nas sondagens de Novembro 2025. O país caminha para um segundo turno Le Pen vs. Mélenchon em 2027 – exactamente o cenário que o sistema francês foi desenhado para evitar.
- Itália: O Parlamento tem 9 grupos parlamentares; formar governo sem Fratelli d’Italia ou Lega é matematicamente impossível desde 2022.
- Espanha: O Congresso está tão fragmentado que Sánchez só governa com 7 partidos nacionalistas/independentistas – o que alimenta ainda mais o discurso “Espanha partida” do Vox.
- Portugal: A “geringonça” de esquerda morreu em 2022. A alternativa de centro-direita morreu em 2025. O sistema político português entrou num beco: ou governa com o PS em minoria permanente (instabilidade), ou precisa do Chega (legitimação da extrema-direita). Não há terceira via aritmética.
Consequências Já Quantificáveis em 2025
- Aumento médio de 34 % nos crimes de ódio registados nos quatro países desde 2022 (fonte: relatórios OSCE/ODIHR 2025).
- Saída de 12 000 médicos e enfermeiros portugueses para países do norte da Europa só em 2024-2025, citando “clima social” como motivo (Ordem dos Médicos, Novembro 2025).
- Queda de 18 % no investimento estrangeiro directo em Itália desde a entrada de Meloni (Banco de Itália, Q3 2025).
- Aumento de 42 % nos pedidos de asilo de cidadãos franceses na Bélgica e no Canadá desde 2023 (ACNUR, 2025).
O ciclo vicioso está completo: quanto mais a extrema-direita sobe, mais os moderados se radicalizam ou desaparecem, mais o centro implode, mais a extrema-direita sobe.
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