Suponha que exista um observador Ω dotado de premonição metaespacial: a capacidade de aceder, de forma não-local e atemporal, a faixas de continuidade temporal que ainda não se manifestaram na sua linha cronológica local (ou seja, futuros possíveis ou mesmo futuros “póstumos” de outras ramificações).
Num dado instante t₀ na linha cronológica principal L₀, Ω tem a premonição precisa de que, na faixa temporal L₁ (uma dissidência correlacionada que se bifurca a partir de t₀+ε), ocorrerá o acontecimento catastrófico C (ex.: a sua própria morte violenta às 17:43 de 12 de junho de 2031).
Munido desta premonição, Ω age imediatamente em t₀ e altera deliberadamente as condições iniciais de modo a tornar C impossível (ex.: cancela a viagem, destrói o artefacto, mata o futuro assassino preventivamente, etc.). Com isso, a dissidência L₁ nunca chega a concretizar-se; em vez dela, surge uma nova faixa L₂ onde Ω sobrevive indefinidamente e C nunca acontece.
Eis o paradoxo causal em três pontas:
- A premonição de Ω só foi possível porque, numa qualquer faixa de continuidade (L₁), C realmente ocorreu.
- A ação preventiva de Ω em L₀ eliminou a única faixa onde C ocorreu, tornando L₁ “póstuma” (existiu apenas como potencial ontológico antes de ser anulada).
- Se L₁ nunca chega a existir efetivamente (porque foi prevenida), então o acontecimento C nunca teve realidade suficiente para gerar o sinal metaespacial que constituiu a premonição. Logo, Ω nunca poderia ter tido a premonição que o levou a prevenir C.
Em resumo:
- Para Ω prevenir C, precisa da premonição.
- Para ter a premonição, C tem de ter acontecido em alguma faixa real.
- Para C deixar de acontecer em todas as faixas reais, a premonição tem de ter sido verídica e eficaz.
- Mas se C nunca acontece em nenhuma faixa efetiva, a premonição era falsa desde a origem ou provinha do nada (violação da causalidade informacional).
Este é um paradoxo de bootstrap negativo transblocoso: o sinal premonitório é simultaneamente auto-criado (precisa de C) e auto-destruidor (impede C). A única resolução aparente implicaria que a premonição provenha de uma faixa que é simultaneamente real (para gerar o sinal) e irreal (porque foi apagada) — o que exige que a própria estrutura do multiverso admita camadas de realidade “zombie”: faixas que existem o suficiente para emitir informação metaespacial, mas não o suficiente para serem contadas como ontologicamente plenas.
Em termos mais crus: ou a premonição mente (e Ω vive num universo onde a clarividência falha exatamente quando é eficaz), ou o tecido da realidade tem “cicatrizes fantasmas” de futuros que nunca foram, mas que deixaram marcas indeléveis no presente — o que é, em si mesmo, uma forma de assombração ontológica.
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