Sobre A Pòs-Democracia, E O Colapso Civilizaciona Na Era Da IA - Esperança Ou Utopia?

 A adoção generalizada de um modelo político-económico – seja ele socialista, neoliberal, capitalista ou populista – pela estrutura política em Portugal revela, desde logo, uma natureza bifacetada que produz efeitos imediatos assimetricamente distribuídos entre grupos sociais. Num modelo socialista, como aquele que o PS por vezes encarna com políticas de rendimento básico ou nacionalizações seletivas, as classes baixas, os funcionários públicos e os setores dependentes do Estado – saúde, educação – beneficiam de maior proteção e redistribuição. Inversamente, pequenos empresários, classes médias altas e investidores estrangeiros veem-se penalizados por maior carga fiscal e menor margem de manobra. Um modelo neoliberal, mais próximo do PSD em fases de privatizações e desregulação, favorece grandes empresas, exportadores e classes altas, mas agrava a precariedade laboral, afeta pensionistas e endivida PMEs familiares. O capitalismo puro, defendido por forças como a Iniciativa Liberal, estimula startups e setores de alto valor, mas colide com sindicatos e funcionários públicos. Já o populismo, seja de direita (Chega) ou esquerda (Bloco), mobiliza os descontentes com a elite – classes baixas rurais ou urbanas marginalizadas –, mas gera hostilidade contra minorias, classes médias cosmopolitas e instituições europeias. Em Portugal, qualquer destes caminhos amplifica desigualdades de curto prazo, dado o PIB per capita a 75 % da média europeia, a dependência de fundos comunitários, a estrutura empresarial dominada por PMEs familiares e o envelhecimento populacional acelerado.

Contudo, o que começa como solução para uns torna-se, numa fase posterior, entrave à democracia e à liberdade de expressão. O clientelismo estatal, típico do socialismo ou populismo, transforma empregos públicos, subsídios e media estatais em instrumentos de controlo: quem critica perde acesso. No neoliberalismo ou capitalismo desregulado, a captura regulatória permite que grandes grupos económicos financiem partidos e moldem leis – as parcerias público-privadas ruinosas são exemplo vivo. O populismo, por sua vez, alimenta polarização identitária que justifica censura sob pretexto de combate ao “discurso de ódio”. Em todos os casos, a dissidência é burocratizada por comissões de verdade ou agências de regulação de media. A liberdade de expressão não desaparece por decreto ditatorial, mas por incentivos assimétricos: quem está dentro do sistema tem voz; quem está fora é marginalizado.

A médio-longo prazo, porém, um modelo bem calibrado pode alinhar-se com a quarta revolução industrial (4RI) – IA, automação, energia verde, bioengenharia – e com a sustentabilidade, beneficiando a generalidade da estrutura política e social. A 4RI só floresce onde houver capital humano qualificado, infraestruturas digitais e instituições que recompensem inovação em vez de redistribuição. O socialismo redistributivo desincentiva risco e depende de impostos sobre setores em declínio; o neoliberalismo desregulado gera inovação, mas concentração de riqueza que alimenta revolta; o populismo rejeita ciência e globalização em nome do curto prazo. Apenas um capitalismo schumpeteriano – destruição criativa com rede de segurança – se mostra compatível, como demonstram Alemanha ou Dinamarca. Em Portugal, nenhum modelo atual está otimizado: o PS prende o país a um socialismo de dependência, o PSD a um neoliberalismo de fachada, o Chega a um populismo reativo. Falta o capitalismo de inovação com Estado estratégico.

Aqui entra o tecnofeudalismo, conceito de Yanis Varoufakis que descreve o domínio de plataformas digitais – Google, Amazon, Meta, Huawei – que controlam dados, cobram renda por acesso a mercados e substituem o Estado em funções essenciais. Em Portugal, a dependência de cloud estrangeiro significa que uma falha na AWS pode paralisar hospitais, finanças ou energia; a perda de soberania digital entrega decisões a Silicon Valley ou Pequim; a desindustrialização cognitiva forma jovens para “gestão de redes sociais” em vez de engenharia. O colapso não é um apagão súbito, mas lento: serviços públicos reféns de plataformas que cortam acesso, extraem rendas insustentáveis ou manipulam narrativas via algoritmos.

Comparando com outros países europeus e os EUA, torna-se claro quem beneficiará da 4RI. Portugal, França, Espanha e Itália – presos a social-democracias pesadas, elevada dívida, baixa natalidade e emigração de talento – não lucrarão. Já Bélgica, Luxemburgo e Suíça, com capitalismo regulado e federalismo, poupança interna e neutralidade tecnológica, estão posicionados para vencer. Áustria e Alemanha combinam economia social de mercado, Mittlestand e formação dual com energia renovável; a Escandinávia oferece flexicurity, alta confiança e IA ética; os EUA dominam IA, espaço e bioengenharia graças a capitalismo de risco e Estado profundo. Estes países partilham capital humano (STEM desde os seis anos), poupança interna, instituições descentralizadas e infraestruturas críticas soberanas.

Para Portugal, o caminho passa por três fases. No curto prazo, aceita-se a transição assimétrica. No médio prazo, combate-se o tecnofeudalismo light com uma agência nacional de soberania digital. No longo prazo, evita-se o colapso silencioso investindo em escolas de engenharia de IA públicas e privadas, energia nuclear de nova geração, cloud soberano ibérico e reforma do Estado baseada em mérito, não clientelismo. Caso contrário, o país arrisca tornar-se museu da 4RI em vez de participante – um mini-Suíça do sudoeste europeu permanece possível, mas exige rutura com o ciclo “Estado obeso + populismo reativo”.

Portugal pode transformar-se num mini-Suíça do sudoeste europeu na era da inteligência artificial através de um plano decenal rigoroso, faseado e mensurável que rompa com o ciclo vicioso de Estado obeso, clientelismo e populismo reativo. O objetivo é posicionar o país como hub neutro de IA ética, energia limpa e formação dual, com PIB per capita a 110 % da média europeia em 2035, dívida pública abaixo dos 60 % do PIB e emigração líquida de talento revertida para +50 000 entradas anuais. O plano assenta em quatro pilares – educação, energia, soberania digital e reforma institucional – executados em três fases de 3-3-4 anos, com metas intermédias auditadas por entidade independente (inspirada no Tribunal de Contas suíço, mas com peritos internacionais).

Fase 1 (2026-2028): Fundações – Capital Humano e Energia Base. A prioridade absoluta é a educação STEM desde os seis anos. Todas as escolas públicas passam a regime bilingue (português/inglês) com 40 % do currículo em programação, matemática avançada e ética da IA; criam-se 50 politécnicos de excelência em parceria com ETH Zurique e MIT, financiados por 2 % do PRR remanescente e impostos sobre plataformas digitais. Paralelamente, lança-se o programa “Nuclear Verde”: construção de dois reatores modulares SMR (300 MW cada) em Sines, com tecnologia francesa e financiamento misto (60 % EIB, 40 % poupança interna via obrigações verdes). A meta é 15 % da eletricidade nuclear até 2028, reduzindo dependência do gás argelino e libertando 1,5 mil milhões de euros anuais em importações. A reforma institucional inicia-se com a extinção de 30 % das empresas públicas não estratégicas e criação de uma Agência de Mérito Público que recruta por concurso internacional, acabando com nomeações políticas.

Fase 2 (2029-2031): Aceleração – Soberania Digital e Indústria 4.0. Com base humana formada, constrói-se o Cloud Soberano Ibérico em Évora: data center Tier IV alimentado a nuclear e solar, com capacidade inicial de 500 MW, operado por consórcio luso-espanhol (Galp, Iberdrola, NOS) e certificação europeia Gaia-X. A legislação obriga todas as administrações públicas a migrar 80 % dos dados até 2031, gerando 10 000 empregos qualificados e poupando 800 milhões em licenças estrangeiras. A formação dual expande-se: 70 % dos jovens de 16-18 anos alternam empresa e escola, com 500 parcerias com PMEs alemãs e austríacas; o salário mínimo em IA sobe para 2 500 euros líquidos, atraindo regresso de 20 000 emigrantes. Energia atinge 30 % nuclear + 40 % renováveis, permitindo exportação de eletricidade para Marrocos via cabo submarino e receita de 2 mil milhões anuais. A reforma institucional aprofunda-se: limite constitucional de 5 % do PIB em subsídios sociais não contributivos, substituídos por rendimento de cidadania condicionado a formação contínua.

Fase 3 (2032-2035): Consolidação – Hub Neutro e Prosperidade Partilhada. Portugal posiciona-se como “Suíça da IA ética”: cria-se o Instituto Europeu de Governaça Algorítmica em Lisboa, financiado por taxa de 0,5 % sobre lucros de big tech na UE, auditando modelos de IA em saúde, finanças e defesa. O país torna-se membro associado do CERN e da ESA para computação quântica, com campus em Coimbra que forma 5 000 doutorados anuais. Energia é 50 % nuclear de nova geração (fusão piloto em 2034) e 50 % renováveis, exportando know-how para África via Parceria Lusófona Verde. A rede 6G soberana cobre 100 % do território, com latência <1 ms, atraindo centros de decisão de multinacionais. A reforma institucional culmina com federalização administrativa: regiões autónomas gerem 60 % do orçamento local, reduzindo Lisboa a 15 % da despesa pública. O imposto único progressivo (15-35 %) financia um fundo soberano de 50 mil milhões até 2035, investido em startups de deep tech.

Os resultados esperados são transformadores: desemprego estrutural abaixo dos 4 %, produtividade 40 % acima da média atual, neutralidade carbónica em 2033, e um índice de confiança institucional idêntico ao da Dinamarca. O risco de tecnofeudalismo é neutralizado pela soberania digital; o clientelismo, pela meritocracia; o populismo, pela prosperidade partilhada. Portugal deixa de ser museu da 4RI para se tornar laboratório vivo de capitalismo schumpeteriano com rede de segurança nórdica – uma mini-Suíça atlântica, neutra, próspera e soberana na era da inteligência artificial.

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